Realizou-se nos passados dias 21 e 22 de Abril o Raid BTT Setúbal-Odemira-Querença organizado pela FPCUB.
Durante dois dias cerca de 50 participantes fizeram mais de 200km em BTT e deslumbraram-se com a paisagem. Um passeio de bicicleta em contacto com a Natureza. Veja aqui o relato dos participantes e algumas fotografias no Fórum BTT.
Já com algum atraso (o empenho foi grande), aqui fica o relato do II Raide BTT Setúbal – Odemira – Algarve da FPCUB, vista de fora (como organizador) e de dentro (como participante).
Dia 0:
Foi o dia mais difícil dos 3. Felizmente tirei a tarde de férias e mal sai do trabalho começou a correria. Um almoço rápido e 1ª paragem na Ciclonatur, para ir buscar o material suplente de apoio ao Raide. A 2ª paragem no Aki para comprar zip-ties, a 3ª paragem em Benfica, na Pastelaria Nilo (onde trabalha o meu pai) para ir buscar caixas de cartão para proteger as bikes
no regresso. Por fim, ir à FPCUB imprimir e plastificar os dorsais e as etiquetas da bagagem, além de combinar os últimos detalhes. Ufa!
Ainda faltava arrumar tudo dentro do carro. O que vale é que a mala parece que estica e lá coube a tralha toda! Com tudo isto só me deitei depois da meia-noite, para acordar às 5:30. Vida dura esta :).
Dia 1:
O nervoso da partida.
Tínhamos encontro marcado em Setúbal às 7:00, metemos o material todo na pick-up e fomos apanhar o ferrie das 7:15. No ferrie havia 2 tipos de fauna bem distintos: os trabalhadores da construção civil dos empreendimentos de Tróia e uns tipos com ar estranho, todos vestidos com uns calções de licra pretos e uma camisolas coloridas. Mas não estamos em Dezembro nem têm pneus finos, não deve ser o Tróia-Sagres versão primaveril!
Felizmente os nossos contactos com o São Pedro funcionaram bem e a chuva prometida estava longe do horizonte. O ambiente era de festa e ansiedade. Aproveitamos o tempo da viagem para ir conhecendo os participantes (se bem que grande parte eram velhos amigos destas andanças) e distribuir os dorsais.
À saída do ferrie instalamos a confusão! Bicicletas por todo o lado, o camião a receber a bagagem, toda a gente a acabar de preparar-se para a grande aventura. Havia problemas de ultima hora com o GPS, pois trabalhar com a caixinha ainda era novidade para alguns dos participantes. Eu apanhei um grande susto, pois perdi o meu saco de bagagem. Felizmente alguém já o tinha atirado para dentro do camião, e lá apareceu no fundo atrás de todos os outros.
Faltava ainda uma equipa. Costuma-se dizer que quem está mais perto é o ultimo a chegar, e a regra confirmou-se. Faltavam os OTT 4, que ficaram a dormir em Tróia. Mas estavam perdoados, tinham vindo do norte no dia anterior! Lá apareceram, foi feito um pequeno briefing e rumámos a Sul!
Aquecimento à la Tróia-Sagres
Como tínhamos 6 guias, ficamos divididos em 3 grupos. À frente, por serem os mais rápidos, os Super-Travesseiros (para quem não sabe o que isto quer dizer, vão participar no TransPortugal organizado pela Ciclonatur – www.supertravessia.com ) Jorge Manso e Cláudio Nogueira. Numa posição intermédia, o Pedro Roque e eu. Atrás, a fechar a caravana, a Marta Vieira e o Luís Triguinho, que esteve no estaleiro e queixava-se que estava a andar pouco e gordo. Pois, pois…
Deixamos partir o pelotão e seguimos. Apesar do alcatrão, é uma zona bonita, ali entalada entre o rio à esquerda e o mar à direita. Pena não haver um trilho com o piso duro, pois com 140 km pela frente não se pode desperdiçar energias a patinar na areia. Mas é uma forma de relembrar os já muitos Tróia-Sagres em que participei e constatar a diferença que fazem os pneus finos naquele piso.
No mundo do arroz
Rapidamente se chega à Comparta, onde íamos aproveitar o troço da Vala Real para sair um pouco do asfalto e pedalar pelos famosos arrozais. Aproveitei para parar e besuntar-me com o protector solar, porque o Sol já queimava.
A pequena paragem foi suficiente para que quem vinha atrás nos apanhasse. Passaram os OTT4, os Alfa e os Averisbike. Os Averisbike tiveram um problema com o GPS e vinham à boleia dos Alfa, disseram que iam continuar com eles. Tivemos que os avisar para não o fazer, pois os Alfa poderiam também chamar-se TGV, pois também estavam a treinar para a TransPortugal, ainda vinham a aquecer!!
Como o Triguinho afinal se andava a queixar de excesso de peso sem razão, trocamos de equipa, indo ele com o Pedro Roque e ficando eu atrás com a Marta. Um pouco mais à frente estavam os Raposa do Mato parados com um furo, pronuncio do que se iria passar no dia a seguir.
Este pequeno troço entre a Comporta e o Carvalhal não tem dificuldades de maior (é um estradão completamente plano), mas ainda bem que é assim, para se poder apreciar a paisagem. Pedala-se entre um canal de água e os campos de arroz, que vão mudando de aspecto conforme a época do ano. À direita temos uma duna com pinheiros e outras árvores de grande porte, que protege esta estreita faixa de terreno da força do mar. Olhando para cima, temos o céu repleto de pássaros de todos os tamanhos, que aproveitam os arrozais para se alimentar, numa feliz comunhão homem-fauna.
Mais um pouco de asfalto…antes da planície enrugada.
Ao chegar ao Carvalhal, retoma-se o asfalto até Melides, pois a areia nos trilhos tornam a progressão da bicicleta quase impossível. É uma estrada que é sombreada por pinhais e também plana, pelo que se chega depressa a Melides, onde verdadeiramente vão começar as dificuldades.
Ao passar pelo Carvalhal vi os Averisbike parados na Junta de Freguesia. Tentavam carregar o track no GPS, mas infelizmente não é assim tão simples, pois é necessário instalar software no PC. Tiveram então que seguir connosco.
Alentejo plano…onde???
Os Averisbike foram um pouco à nossa frente, mas quando chegamos a Melides eles ainda estavam lá, pois muitas equipas pararam no café para repor as energias. Já tínhamos percorrido 45 km! A Marta estava a ter algumas dificuldades em ganhar ritmo, pois dormir pouco para ela é demolidor. Ainda por cima estávamos a entrar na parte mais difícil do percurso.
É uma zona de serra, onde se passam barrancos atrás de barrancos. A Marta vinha cansada, fazia as subidas devagar mas o pior mesmo eram as descidas, onde era preciso força para segurar a bicicleta e reflexos rápidos para fugir das pedras. Chegou a considerar ir para o jipe dormir um bocado e continuar mais à frente, mas como vinham 2 pessoas na viatura, tinha que ir
encaixada no lugar do meio, achou que não ia conseguir descansar!
Mas devagarinho lá foi passando barranco atrás de barranco. Parámos um pouco e comeu uma barra de doce e uma banana, que um pouco mais à frente começaram a fazer efeito. Os barrancos também foram ficando mais suaves pelo que o pior já tinha passado, começamos a pedalar a bom ritmo.
Já a chegar a Santiago do Cacém a fome também começou a apertar comigo. Comecei a dizer que ia parar para comer todas as porcarias a que tinha direito, uma bifana cheia de mostarda, uma coca-cola e batatas fritas. Aí a Marta meteu o turbo e começou a pedalar ainda mais rápido, estava a ver que era eu que ficava para trás! A fome faz milagres!
Restaurante Carapinha, as melhores bifanas de Santiago do Cacém
Quando chegamos a Santiago do Cacém parámos no Restaurante Carapinha, o primeiro tasco que aparece no caminho! Afinal não estávamos assim tão atrasados, ainda lá estavam a acabar de comer umas bifanas em pão alentejano com aspecto delicioso os KedasBike e os Raposas do Mato.
Comemos todas as porcarias a que tínhamos direito e ainda comprei um chocolate que se revelou muito útil mais lá para o fim do dia. Sobe também no final do dia que a bifana vinha em pão alentejano porque as carcaças tinham acabado. Devia ser considerado crime desperdiçar uma bifana daquelas com uma carcaça, havendo um pão alentejano tão bom!
A caminho do Paiol, às curvinhas pela serra
Mal saímos das bifanas encontramos os Raposas do Mato a encher os pneus numa bomba de gasolina, pelo que fomos juntos com eles até à Soneca. Descobrimos que o irmão gémeo de uma das raposas é colega de faculdade da Marta. Como o mundo é pequeno!
O percurso até à Soneca não tem dificuldades de maior, mas vai moendo aos poucos. É um percurso muito belo, no meio dos sobreiros e das azinheiras, ora sobe, ora desce, ora sobe mais um pouco. Um pouco antes de se chegar à Sonega passa-se a barragem de Morgavel pelo paredão, uma bela albufeira onde sopra sempre algum vento. Depois até à Sonega sobe-se mais um pouco, pelo que a chegada à aldeia é sempre um bom pretexto para comer alguma coisa e repor energias.
A serra vista da planície
A Sonega marca uma transição na paisagem, pois a partir de agora passa-se a circular entre campos agrícolas completamente floridos nesta época do ano. É um tapete colorido que ondula ao sabor do vento, como se estivesse vivo!
A bifana continuava a fornecer energia, a Marta pedalava a bom ritmo apesar dos já muitos quilómetros efectuados. No entanto com a paragem na Sonega deixamos de ver os Raposas do Mato e os KedasBike.
Ao chegarmos mais perto da Serra do Cercal apanhamos um estradão que é uma autêntica AE, óptima para ganhar velocidade e avançar uns bons quilómetros sem grande esforço.
Após passarmos a estrada N390 acabam as facilidades, fazemos uma descida cheia de pedra até passarmos a ribeira do Corgo. Como quem desce, sobe, do outro lado temos de trepar também no meio da pedra, num local onde só os mais fortes não desmontam.
Rapidamente se chega à estrada N532, que se atravessa para entrar num estradão no meio dos restos de um eucaliptal cortado este ano. Já começa a cheirar a Odemira!
Odemira a aproximar-se e as forças a esgotarem-se
Após o estradão no meio do ex-eucaliptal chega-se a Troviscais e a partir daí o percurso é quase todo em alcatrão. E que bem que sabe o alcatrão depois de tantos quilómetros, quando já só se pensa em chegar e tomar um belo banho! Mas as dificuldades não se afastaram, pois a falsa planície alentejana faz mossa e qualquer pequena subida já parece uma montanha de 1º
categoria.
Fui numa dessas “montanhas” que encontramos os KedasBike, a depenar uma nespereira! Quando parei ouvi o dono da nespereira a gritar de casa: “Já chega! Já chega!” A fome é negra!
Chegamos à estrada principal para Odemira, a N120. Estava prometida uma valente descida até à ribeira do Torgal, mas a gravidade deve ter tido algum problema e afinal só apareciam subidas, a parte a descer deixou muito a desejar…
Depois de passar a ribeira já faltava pouco. A Marta já tinha gasto as reservas todas, vinha em serviços mínimos. Eu tentava incentiva-la, mas não tive grande sucesso. Já não fizemos um pequeno desvio por terra do lado direito (será que alguém fez?) e chegamos ao pavilhão por volta das 20:00, 140 km depois.
Dia 1,5:
As noites loucas de Odemira:
Depois do empeno dos 140 km sobe muito bem o banho quente e o lanchinho comprado no supermercado pelos colegas organizadores que já tinham chegado! Eles entretanto foram indo para o restaurante e eu e a Marta ficamos a acabar de nos arranjar.
Felizmente para o centro de Odemira era sempre a descer…mas o empeno era tão grande que me consegui perder, fui ter para lá da ponte sobre o Rio Mira e andava à procura de uma rua à esquerda quando afinal queria era ir para a direita. Lição aprendida, no caso de grande empeno, levar sempre o GPS!!!
O telefonema para o restaurante no dia anterior a lembrar que iria haver invasão de famintos deu bom resultado. Comi uma bela vitela estufada com muito esparguete!
A esplanada exterior do restaurante foi invadida pelos seres esfomeados, a senhora do restaurante não vai esquecer esse dia tão cedo, de tanta comida que nos serviu! Os seres esfomeados aproveitaram também para contar as “estórias” do dia e para o Sr. Caetano (presidente da FPCUB) fazer a chamada como na escolinha, para distribuir os cartões aos novos sócios!
A subida para o pavilhão serviu para esticar as pernas e foi feita pelo caminho certo, apesar das dúvidas de alguns ilustres conhecedores daquelas paragens. Afinal não era só eu que andava perdido!
No pavilhão já muita gente dormia. O responsável pelas instalações estava preocupado, pois pela noite dentro ia ser desmontada uma estrutura na sala ao lado (de um espectáculo de Wwrestling), iam ter que fazer algum barulho. Se o fizeram ou não, desconheço, mas a verdade é que ninguém ouviu nada, dormiram que nem uns anjinhos!
Dia 2:
Hora de acordar
Mal começou a entrar luz pelas janelas do pavilhão, os mais madrugadores acordaram. Todos os outros foram acordando, com maior ou menor dificuldade, e rapidamente o pavilhão se tornou numa espécie de bazar. Sacos para aqui, mochilas para ali, sacos-cama, colchões, garrafões de água, bananas, barras, sandes, sumos. E ao fundo, cheias de pó e alguma lama, os veículos de tortura aguardavam ansiosos para mais 120 km de aventura.
Como é normal, pela presença do rio Mira, cá fora estava algum frio e nevoeiro. No exterior formou-se uma pirâmide de sacos e mochilas (o camião só vinha mais tarde recolher o material) e os participantes doridos e com sono faziam as ultimas afinações nas bicicletas.
Pelo rio acima, a afastar o nevoeiro
Com o pequeno atraso da praxe, foi dada a partida, Odemira abaixo. O frio apertava, mas não era boa ideia levar roupa quente, o sol prometia vencer as nuvens rapidamente.
Ao contrário do ano passado, não passámos o rio Mira em Odemira, seguindo-se junto a ele por alguns quilómetros, pela margem norte. Tal como no dia anterior segui atrás da caravana, acompanhado pelo Triguinho e pela Sandra Correia, outra participante feminina, que foi sempre junto de membros da organização, pois os companheiros de equipa estavam a treinar para o Transportugal. A Marta resolveu não fazer estes primeiros quilómetros, pois já os conhecia do reconhecimento, pelo que seguiu na pick-up jipe até São Marcos da Serra.
Logo após as primeiras subidas encontrei os Chaparros em dificuldades. Uma corrente, que apesar de nova, teimava em não colaborar. Fiquei com eles, continuando o Triguinho e a Sandra a pedalar. Corrente ligada, lá seguimos, às curvinhas pela margem do rio.
Infelizmente o nevoeiro não deixava ver toda a paisagem, mas o que se via era muito belo. Não me vou esquecer tão cedo de uma seara ainda verde, mas com as espigas totalmente brancas, por absorverem as gotas do nevoeiro. Felizmente foram tiradas algumas fotos neste local!
Mas os problemas mecânicos não tinham terminado. Um pouco mais à frente estavam as Raposas do Mato, com o primeiro de muitos furos do dia, pelo que até ao final foram a minha companhia. A passagem do Mira estava próxima. Apesar da grande extensão de água que era preciso atravessar, podia-se fazer tudo a pedalar e aproveitar para lavar os cubos das rodas.
A Portela da Fonte Santa já estava próxima, local onde íamos fazer um pouco de asfalto, numa estrada nova e praticamente deserta, acompanhando de perto o Mira até Sabóia e dai até ao Viradouro. É uma estrada com uma paisagem tão bela que quase se esquecem as subidas que tem pelo meio. Do lado direito mais selvagem, do lado esquerdo grandes searas ou terras de cultivo com pequenas plantas e flores das mais variadas cores.
No Viradouro atravessamos a EN 266, passando a acompanhar a renovada linha de caminho de ferro do Sul.
Pela linha abaixo, olha lá vai o Pendular
Logo ao sair da EN 266 atravessamos um pontão sobre a Ribeira de Telhares, que iremos atravessar inúmeras vezes até chegar a Pereiras. No início seguimos por um estradão novo que parece ter servido de apoio à renovação da linha, mas depois de um pequeno desvio à direita entramos num caminho mais antigo e fechado. Começa aí a saga dos atravessamentos da ribeira, que tem uma água cristalina e fresca. Com o Raide mais para o verão dava banhoca na certa!
Foi dentro de uma destas ribeiras que voltei a encontrar os Chaparros, não a tomar banho, mas outra vez com a mesma corrente partida. Aproveitando o facto de o jipe vir mesmo atrás, resolveu-se o problema de vez, com uma corrente nova.
Sobe, desce, desvia do calhau e das rãs.
Em Pereiras atravessamos a linha do caminho-de-ferro por uma passagem superior, entrando no troço mais selvagem de todo o Raide (onde até uma lebre vimos durante os reconhecimentos).
É uma zona dura, com descidas e subidas bem inclinadas e com alguma pedra à mistura. A paisagem à volta é completamente selvagem, onde só muito raramente se vê intervenção humana. Nas zonas mais baixas formam-se grandes poças de água, que nesta altura do ano estão cheias de pequenas rãs (que durante o reconhecimento eram apenas girinos).
No topo de uma das subidas mais difíceis estavam outra vez as Raposas do Deserto, a descansar, pensava eu. Também deviam estar a descansar, mas tinham tido outro furo. Novamente o jipe foi útil, para reforçarem o stock de câmaras-de-ar, pois já se estavam a esgotar.
Depois de uma viragem à direita o percurso ficou menos agreste, seguindo paralelo ao curso de uma pequena ribeira, incluindo um pouco mais à frente uma longa descida bem divertida…excepto para as Raposas, que tiveram o 3 furo do dia quando ainda só tínhamos feito cerca de 40 km.
Comecei a ficar preocupado, pois as horas estavam a passar, ainda havia muitas dificuldades pela frente, o autocarro de regresso estava marcado para as 20 horas. Tive que os disciplinar, pelo que os proibi de ter mais furos! A partir daí portaram-se bem, os problemas mecânicos acabaram!
Não demorou muito mais para chegarmos a S. Marcos da Serra, onde a Marta nos esperava numa fonte à entrada da povoação. Ao chegar dei duas apitadelas, que a acordaram (já sabia que ia adormecer enquanto esperava por nós!).
Aproveitamos para repor as reservas de água, o calor tinha vindo em força, eu já estava seco. Seguimos para dentro da vila, onde procuramos um café para comer alguma coisa rápida, para não nos atrasarmos mais.
A Perna Seca ainda tem água
Como em S. Marcos da Serra não quis sair do track (podia alguma equipa ter saído para ir a outro café e depois não os via passar), acabamos por parar num tasco muito fraco. Mas deu para comer um chocolate, batatas fritas e seguir viagem sem perder muito tempo.
Passámos por cima do IP1 e algumas curvas à frente encontrámos a ribeira da Perna Seca, que com as chuvas de Abril ainda tinha bastante água! Mais diversão, pois com o calor que estava sabia bem passar a ribeira vezes sem conta “à abrir” e molhar os pés!
Abandonamos a Perna Seca num cruzamento à direita, para entrar num estradão que mais à frente ganha uma camada de alcatrão. É ligeiramente a descer, o que com o calor que estava soube muito bem, tanto que as Raposas do Deserto ganharam velocidade e não olharam para o GPS, seguindo em frente na viragem à esquerda novamente para terra.
A ribeira do Arade e a serra Algarvia a fazer mossa
Depois de entrarmos em terra seguimos direitos à Ribeira do Arade, que atravessamos justamente na povoação com o nome da ribeira. Entramos aqui numa dos locais com mais dificuldade do raide, pois pela frente temos, num buraco, a ribeira do Gavião, caminhos cortados pela vegetação e cães do tamanho de vitelos muitos zelosos do seu território…
Entramos assim numa montanha russa, que acaba numa descida vertiginosa quase a tocar novamente a Ribeira do Arade…e uma subida ainda pior, até passarmos dentro de um túnel, para atravessar a A2. Ufa. Mas já encontrámos alternativas nas cartas militares, se para o ano os participantes oferecerem um queijo da serra aos organizadores, prometemos encontrar um caminho mais fácil!
Aproveitámos a sombra do túnel para comer e arrefecer, pelas minhas contas estávamos a andar bem, ainda ia dar para jantar e tomar banho antes do autocarro sair!
Após a passagem da A2 chegamos a Vale Figueira, onde entramos numa estrada que nos permitiu fazer mais alguns quilómetros rapidamente, até à povoação de Corchicas. Aí vamos seguir por um estradão em muito bom estado, mas não sei antes fazer uma paragem junto de umas laranjeiras carregadinhas de fruta com aspecto biológico!
Alte, Alte, Alto
Apesar dos quilómetros acumulados as Raposas do Deserto continuam a pedalar a bom ritmo, assim como a Marta, que acumulou forças durante a sestinha em S. Marcos da Serra.
Em Vale das Poças estava “empanado” um KedasBike, o David Santos, à espera que a pick-up o viesse buscar. Já que estava ali o jipe, e felizmente ainda vazio, liguei a avisar que já não era preciso.
E que bom local para desistir! Logo a seguir iniciávamos a subidas para o alto, quer dizer, para Alte. Passamos primeiro por Santa Margarida e depois por um trilho panorâmico até ao centro de Alte, que cruzamos bem pelo centro, por ruelas estreitas, num pequeno down-town.
Bem vindos ao Reino da Laranja
À saída de Alte seguimos a meia encosta, no meio dos laranjais, com a paisagem a lembrar as vinhas do Douro, mas muito mais perfumada. Quase que se consegue imaginar os campos cheios de trabalhadores, a subir e a descer os socalcos com pesados cestos cheios de laranja. Mas felizmente para os trabalhadores, aqui o terreno não é tão inclinado!
Foi aqui que comecei a desconfiar que estava a fazer mal as contas aos quilómetros que faltavam. Pensava que faltavam uns 30 km, mas estando em Alte, Querença é já ali! Ainda bem, pois as Raposas começavam a mostrar sinais de cansaço.
O terreno plano acabou subitamente numa curva apertada à direita, onde entrámos numa rampa em cimento, que nos levou à povoação de Espargal. Era a ultima dificuldade do Raide, não contanto com a chegada a Querença.
Ribeira “expresso” Algibre
Como durante o reconhecimento só encontrámos caminhos lavrados, barrentos e húmidos (por estar a chover, uma mistura explosiva), a descida para a Ribeira de Algibre é feita a alta velocidade por asfalto. Atravessamos a ribeira e viramos à esquerda, pois vamos seguir pela sua margem quase até Querença.
Entretanto disse às Raposas que só já faltavam uns 12 km e não 30, eles ligaram um turbo e durante algum tempo desapareceram-me de vista, pois o caminho sinuoso a serpentear a ribeira não permitia ver muito longe.
Voltei a apanhá-los junto ao cruzamento com as EN525 e EN524, sendo que iríamos nesta última até Querença, pois o caminho junto à ribeira, durante o reconhecimento, estava cortado por causa de um desmoronamento de terras.
Finalmente, Querença
Não demorou muito a aparecer a placa mais ansiada, Freguesia de Querença! E claro, a já mítica subida, por uma calçada estreita e muito, muito inclinada até ao Largo da Igreja, que infelizmente estava em obras. No meio da subida vimos uma placa a dizer “Calçada Medieval”, ou seja, podia ter sido bem pior!
Como fui dos últimos a chegar, já só tive direito a banho de água fria. A freguesia de Querença é pequena, infelizmente os balneários não estão dimensionados para tanta gente. Se aos primeiros sabe bem ficar uns minutos debaixo do chuveiro, depois os últimos têm de tomar banho de água fria.
Mas o melhor estava mesmo no fim. Um divinal porco no espeto, que apesar das horas tardias a que cheguei ainda estava quente, salada de arroz, pão, fruta, vinho, sumos. Um muito obrigado a todo o pessoal da J. F. de Querença por ter abdicado do descanso de domingo para nos receber tão bem.
Soube também muito bem voltar para Setúbal de autocarro, em vez de vir apertado de carro. Pensava que o pessoal ia dormir a viagem toda, mas afinal já tinha recuperado as energias gastas e aproveitou para meter a conversa em dia e contar as aventuras do Raide.
Mas alívio foi só mesmo em Setúbal, quando alguns minutos depois do autocarro, chegou o camião com as bicicletas e a bagagem. Felizmente tudo tinha corrido bem, nada de muito importante falhou na organização. Ufa! Pior foi ir trabalhar no dia a seguir…
Agradecimentos
Para terminar, umas palavras de agradecimento às pessoas/entidades que nos apoiaram na organização: A transportadora FTS, com o camião para transportar as bagagens e as bicicletas, a Rotas e Sistemas, com a sempre reconfortante viatura TT, novamente à Junta de Freguesia de Querença e à Câmara Municipal de Odemira (pelo pavilhão gimnodesportivo). Por fim, ao António Malvar, da Ciclonatur, pelo apoio que deu ao nível de peças sobresselentes, mas principalmente, por ter contribuído por vulgarizar o uso do GPS nas bicicletas, o que nos permitiu organizar um evento deste tipo.
Obrigado também a todos os participantes e espero que até para o ano!
Rui Sousa